Tenho um aluno que a cada aula chega com uma listinha de palavras aprendidas, seja pra me mostrar, orgulhoso, ou pra me pedir mais esclarecimentos. Outro dia, ele chegou ansioso, nem me deixou introduzir a aula e já foi dizendo: “Professora, eu ouvi algumas palavras novas esta semana”. Eu, curiosa e animada, perguntei:
— Ah, é? Quais são?
— Propina, estelionato, sonegar, extorsão e fraude.
Parei pra respirar, talvez tenha até ruborizado, não tenho certeza. Afinal, todos esses termos já banalizaram no noticiário. Mesmo assim fiquei um pouco envergonhada de ser esse o tipo de palavra que ele ouve no dia a dia dele enquanto pratica português.
Eu podia ter falado que propina tinha o mesmo significado do espanhol, já que ele é venezuelano e entende a palavra como uma inocente gorjeta. Infelizmente, apesar de também ter esse sentido em português, tive que confessar que o uso disseminado de propina é como suborno mesmo.
Já imaginou se estelionato fosse simplesmente um novo modelo de caneta, uma versão melhorada da caneta esferográfica, o canetão estelionato, um tipo especial de canetão que escreve transparente. Seria bem mais simpático do que o sentido de “prática criminosa em que alguém obtém uma vantagem ilícita em prejuízo do outro”.
Cogitei tentar convencê-lo de que fraude é aquele pano que se usa em bebês que ainda não têm condição de usar o banheiro. Antigamente se usavam as de pano, depois vieram as fraudes descartáveis e agora voltou a moda das fraudes reutilizáveis. Você dá uma boa lavada e continua a usar.
Extorsão, por sua vez, seria uma cirurgia estética pra retirar gordura de partes nobres.
Depois de refletir um pouco, achei melhor não, duplos sentidos a parte, ele é um ótimo aluno e tinha feito bem o dever de casa. Foi logo completando que fraude e extorsão são crimes. Só me restou esclarecer que o primeiro é o “ato de deliberadamente enganar outros com o propósito de prejudicá-los”, e que o segundo é “obrigar alguém a fazer algo para obter vantagem por meio de ameaças”.
Gostaria de poder dizer que sonegar era um verbo derivado da palavra sono, uma espécie de sinônimo de cochilo. Seria bem menos vergonhoso que admitir que todos os dias os jornais falam de políticos e empresários que “esconderam algo fraudulentamente ou eximiram-se ao cumprimento de uma ordem”. Eu diria: “Dormi tão pouco noite passada que até soneguei no trabalho, enquanto fazia o relatório do orçamento do mês.” “Na volta pra casa, dei até uma sonegada no trânsito.” Seria bem mais inocente e divertido.
Fontes: Dicionário Online de Português; Dicionário de Sinônimos; Significados.com.br
Comments